segunda-feira, 22 de maio de 2017

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Jonas

A música eletrônica soava alta em seus ouvidos e os corpos suados se contorciam a sua volta, ele dançava freneticamente buscando desligar seu cérebro e com ele as vozes que lhe enlouqueciam. Estava com sede novamente mas comprar água no bar era contra seus princípios e principalmente contra seu bolso.

Jonas cambaleou até o banheiro tentando lembrar o que acontecia, havia tomado a quinta bala da noite e precisava molhar a cabeça e beber água, sua temperatura estava elevada. A batida da música foi substituída por David Bowie no banheiro, Paper Boy. O extasy o levava longe, ajudava a ver coisas que os outros não viam, mas David Bowie era demais para ele. Abriu a torneira, observou sua imagem no espelho, baixou o rosto para beber usando a mão em concha e sentiu um arrepio na nuca que percorreu todo seu corpo.


Subiu a cabeça lentamente para o espelho que muitas vezes já lhe trouxe imagens do outro lado. Nada.

Escuta uns resmungos chorosos e busca de onde provem o som, caminha pelo banheiro até o fim do corredor e chega à origem.

“Ei, tudo bem aí?” pergunta ele.

“....”

“tudo bem?”

“Você está falando comigo?”

“errr, sim.”

“Porque você está falando comigo?”

“Você estava chorando, vim ver se estava bem”

“eu não estava chorando”

“Estava”

“Não estava”

“Bem...”

“Você sabe com quem esta falando?”

“Não, alias meu nome é Lucas, e o seu?”

“Claro que seu nome é Lucas, pode me chamar de Gabriel”

“Que aconteceu então, quer falar?”

“Falar? Você acha que é isto que estamos fazendo?”

“Bem, sim.”

“Se você diz.”

“ok, mas por que está, consternado?”

“Eu fiz coisas ruins”

“Bom, más como?”

“RUINS E NÂO MÁS!!!, Há uma diferença!!”

“Não estou julgando, Não estou julgando!” Exclamou Jonas preocupado com o rumo que a conversa tomava, não iria mais usar aquela merda. “porque comigo, sempre comigo” pensava.

“Está bem, eu fiz coisas que me pediram para fazer, coisas ruins, difíceis.”

“Você... machucou pessoas?” Disse Jonas lentamente se deslocando para a porta.

“Me pediram para fazer essas coisas”/

“Mas quem pediu?”

“Deus”

“Hmm, você sabem o que dizem né, se você fala com Deus, você está rezando, se Ele fala com você, você é esquizofrênico.” Sorriu com a própria graça.

“Você realmente está viajando né?

“Que tem a ver uma coisa com outra?”

“Nada Jonas, nada. Vá embora me deixe pensar. E, um conselho, saia deste bar e não olhe para trás, tenho uma missão a cumprir.”

“...”

Os resmungos recomeçaram e Jonas não satisfeito com o rumo da conversa resolveu espiar pela fresta do compartimento para saber o tamanho do problema que se avizinhava, se precisava chamar a polícia ou não seria necessário.




(Continua)

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Ressurreição




A escuridão se tornara convidativa, acolhedora, quase maternal. Lucas, sentado em frente à escuridão, apenas observava e se deixava escorregar em sua direção, fecha os olhos calmamente, está em paz.

Violentamente foi agarrado pelos ombros e arrastado para trás; gritando, desperta. As dores que lhe acometiam naquele instante criavam-lhe a sensação de rios de lava correndo por suas artérias e sob sua pele, seu coração tentava pular pela boca sem ritmo, procurou se mover e percebeu estar amarrado fortemente a sua cama, os pés juntos e os braços estendidos abertos para os lados. Tentou abrir os olhos, mas estavam vendados, ao forçar os braços para escapar foi agarrado nos dois lados, gritou, mas sua voz não saiu, apenas um grunhido rouco irreconhecível, a dor acalmou por alguns instantes apenas para começar novamente.

"Você está a salvo, sei que a dor parece insuportável, mas é sua única chance de sobreviver”.

 

 Sua resposta foi apenas mais um grunhido seguido de um urro de dor. Suas lágrimas ardem ao deslizar por sua pele, grossas e pesadas. Ao virar o rosto uma corre para sua boca, o gosto acre não deixa dúvidas do que escorre por seus olhos.

 

"Aguente firme, Lucas. Meu nome é Peter Vincent e este é William Van Der Gessiger, você está bem assessorado para ajudá-lo no que está por vir.” Falou calmamente Peter.

 

"E o que está por vir?" sussurrou Lucas.

 

"Infelizmente você não vai gostar" falou resignado William. "Temos que minimizar os efeitos colaterais do que aconteceu com você, lembra de alguma coisa?"

 

"Ela" no instante seguinte um gosto acre e rançoso de sangue espirra de sua boca em um jato que lhe deixaria enjoado se as dores, agora no seu estômago, não irrompessem furiosamente. "Quão mal eu estou?" balbucia.


 

"Sabe quando você se machucava e sua mãe dizia que poderia ser pior? Era a isso que ela se referia."

 

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terça-feira, 12 de maio de 2009

Nota do autor

Para facilitar a compreensão, na coluna da direita aparecem os capítulos em ordem cronológica, seguindo as duas épocas que se desenrola a história (até agora), "then" são capítulos que aconteceram a partir da década de 80, e "now" são as que ocorrem a medida que são lidas. Abaixo existe também uma coluna com os nomes dos personagens e os capítulos em que aparecem na ordem que a história é contada, em seguida retratos dos personagens para dar uma cara aos nomes e lá embaixo a história na ordem que está sendo contada. 
Era isso e bom proveito!

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Tentação


William acorda sobressaltado puxando de baixo do travesseiro a famosa Colt peacemaker que lhe acompanha a todos os lugares, inclusive ao banheiro após o pequeno incidente que lhe acometera anos antes provocando um enfrentamento de mãos limpas e completamente nu com uma criatura das trevas, não é uma lembrança que lhe agrade e nem uma história para contar, não se orgulha de como teve que resolver aquela situação. Em segundos entendeu que seu telefone celular acusava por vibração a chegada de uma missiva eletrônica, o que provocou sua curiosidade, poucos possuíam aquele número e realmente muito poucos teriam coragem de utilizá-lo. Antes de pegar o aparelho, correu os olhos pelo quarto procurando alguma falha nas barreiras de sal que bloqueavam as aberturas de seu aposento, a pequena janela voltada para o leste – quanto antes o sol alcançá-lo melhor – e a porta ao sul – sempre dormia com a cabeça para o norte e jamais de costas para a porta, o que dificultava um pouco seu pernoite em outros aposentos, por algum motivo incompreensível para ele, os quartos não são todos construídos desta maneira – constatando que as linhas de sal continuavam intactas, “mais uma noite, mais uma dádiva” disse ele seguindo seu ritual matinal e toma o telefone nas mãos. Passa rapidamente os olhos pela mensagem e motivado pela urgência do fato apresentado em poucos minutos já está com a mochila com os instrumentos necessários para a tarefa que lhe foi designada, montado em sua bicicleta e pedalando furiosamente para o endereço que recebera na mensagem.


“Ela novamente, mais uma vítima da maldita Nadja, linda e maldita, tem prazer em provocar as transmutações e me deixar saber, sou obrigado a por fim as suas existências miseráveis e malditas, mas um dia encontrarei Nadja novamente e será o fim para um de nós”.

Chegou rapidamente ao apartamento, chutou a porta e rolou para dentro apoiando-se ao solo com o joelho esquerdo e o pé direito, segurava a Colt com a mão destra calçada sobre o pulso da sinistra que empunhava sua adaga, de maneira invertida. Sua preferência, apesar da ambidestria, era usar a adaga na canhota, onde provocava mais estragos, acreditava por vezes que tinha menos escrúpulos com aquela mão.

Perscrutou rapidamente o ambiente avaliando a situação, os recém transformados não sabiam de suas capacidades, mas ainda assim eram bastante destrutivos, todo cuidado era pouco, entretanto os gemidos que ouvia não condiziam com um recém transformado, “cheguei cedo demais?” e dirigiu-se a proveniência dos sons encontrando um homem se contorcendo na banheira, sem desviar os olhos investigou rapidamente o banheiro até encontrar as palavras no espelho e em sequência o bilhete que ela deixara.


Atônito procurou recapitular a situação, “ela o mordeu e o largou vivo na banheira, o gelo deve retardar o processo, não passou seu sangue para ele, está no vidro, lhe deu uma opção, mas como ele ainda está vivo? Tem sangue em seus lábios, provavelmente o suficiente para mantê-lo até eu chegar, mas e agora? Devo matá-lo? Cortar sua cabeça?” foi tirado de seu devaneio pelas palavras do homem. “Me ajude” e começou a convulsionar na banheira. William pegou seu telefone e ligou para o número da única pessoa disponível com conhecimento suficiente para lhe ajudar, Ozzy estava ocupado demais com Bill (Gates).

“Peter Vincent, Vampire Slayer, ao seu dispor” disse a voz ao telefone.


“Peter, William”

“Ah, diga.”

“Encontrei uma vítima sugada, viva e não transmutada, aparentemente com uma pequena dose de sangue em seus lábios”.

“Banheira de gelo?”

“Sim”

“Por que eles fazem isto? Por que não definem a situação? Não podes imaginar a dor que ele deve estar sentindo, ou melhor, claro que pode. Ele está acordado? Bom, estou ouvindo os gritos, você tem epinefrina, claro, misture com a solução de alho e a água benta.”

“Água benta? Mas não tem utilidade!”

“Ah, claro, você já sabe disto, dilua com água então, e reze. Bom, não precisa rezar, só espere umas duas horas, se ele sobreviver, leve-o para casa, precisará ensiná-lo algumas coisas, mas isto é um passo posterior. Aplique a injeção que não agüento mais estes gritos!”

“Obrigado Peter”.

“Peter Vincent,Vampire Sayer, desligando”.

William preparou rapidamente a injeção e em instantes o rapaz parou de se debater, cansado, antes de  desfalecer, ainda disse algumas palavras que William entendeu como o próprio nome e de seu algoz.

“Nadja, Lucas” e caiu em sono profundo.


 

 

 

terça-feira, 5 de maio de 2009

Martírio

Ouço um som compassado lembrando o de um velho trem passando pelos dormentes, entretanto não existem trens por perto, ao menos não na minha memória. Um cheiro acre penetra em minhas narinas e minha pele toda parece estar em brasas. Minhas pálpebras pesadas insistem fechadas, a garganta seca me impede de engolir, os músculos dormentes, frio. Tento mover os dedos, água. O som continua, lembrando um gigantesco catavento agora acompanhado por outro também ritmado, retumbante, pancadas. Novamente forço meus olhos e uma profusão de cores e luzes os obriga a fechar novamente. Perco a consciência.


Não sei quanto tempo permaneci desacordado, mas agora consigo abrir os olhos, ouço o ventilador de teto do quarto ao lado girar devagar, aos meus pés gotas delicadamente se desprendem do chuveiro mal fechado retumbando na água da banheira. Ouço meu coração se esforçando para bombear o que resta de meu sangue através de meu corpo. Ainda não consigo me movimentar, mas vejo as barras de gelo na água ensaguentada a minha volta, a confusão do momento não me impede de perceber que algo está errado, tento lembrar o que aconteceu, como fui parar naquela banheira quando olho para o lado e vejo no espelho escrito com batom:

“Não saia da banheira”

“Leia o bilhete”


Volto os olhos à banqueta ao meu lado e encontro um telefone celular, uma prancheta de acrílico com um bilhete preso a ela e uma caixinha metálica com aparência antiga. Tomo a prancheta em minhas mãos e leio o seguinte bilhete.

“Surpreendente, não imaginei que você pudesse sobreviver, mas é impressionante como a vida sempre encontra um meio, um caminho. Como está lendo este bilhete terá a opção que poucas vezes eu dei, não deve lembrar de muita coisa agora, mas precisa entender que sua vida dependerá da decisão que irá tomar nos próximos minutos. As dores em breve irão começar embotando seus sentidos e sua capacidade de tomar decisões, para mim pouco importa, mas suas últimas palavras me fizeram pensar então resolvi lhe dar o que pode se chamar de uma chance. No celular está pronta a mensagem com seu endereço e o que aconteceu com você, a pessoa certa receberá. Só ela poderá salvar aquilo que você chama de vida, e na caixinha, seu passaporte para a escuridão. Creio que imagens do que aconteceu estão se formando em sua mente, não espere lamentos ou arrependimentos de minha parte, não faz parte da minha natureza. Achei divertido, assim como acharei divertido encontrá-lo novamente, independente do lado das trevas que você estiver. Nos meus cálculos você tem algo em torno de dois minutos para decidir entre o telefone e a caixinha, depois deste tempo você ira agonizar até a morte, não é uma boa morte, eu teria uma melhor para você, mas como eu disse, assim é mais divertido. A propósito, no espelho, não é batom.”


Finalmente as imagens da noite anterior me acometem freneticamente acompanhadas de delírios, a linda mulher, o vinho, sangue ou vinho, ela sobre mim, mais sangue, meu pedido, últimas palavras, quem sou, quem é você, ela me carregando praticamente desacordado para a banheira cheia de água, a água perdendo a transparência, ela escrevendo no espelho, colocando o dedo na boca e me olhando por sobre o ombro, um sorriso cínico, vem na minha direção, um beijo nos lábios, o gosto acre, fecha meus olhos com as pontas dos dedos, um dor lancinante corta minhas costas, preciso decidir, abro a caixa, um frasco, liquido vermelho, denso, deixo de lado, o celular, não consigo ler a mensagem, enviar, aparece um nome. William.


sábado, 18 de abril de 2009

William - origins - parte 1

20 de janeiro de 1982

O vento frio queimava meu rosto e esvoaçava meus cabelos, a sensação de liberdade dos anos 60 de Easy Rider em plenos 80, quando subo em minha Chopper consigo esquecer essa porra de New Wave com suas ombreiras cor de rosa e mullets e tudo com cheiro de maça verde, mas a liberdade durou pouco, o sol em vão tentava me aquecer, mas a tempestade me consumia. O tempo, como sempre, contra nós. Bobby e eu percorríamos a estrada há algum tempo já, seguíamos as criaturas há semanas sem sucesso, entretanto, finalmente entendêramos seu padrão. Por algum estranho motivo elas também odiavam New Wave e buscavam sempre por concertos de rock, haveria um em Des Moines, Iowa, hoje à noite. “Diary of a mad man”, Ozzy Osborne ressurgindo.
Por incrível que pareça não permitiam entrar em shows de rock com o equipamento necessário, Bobby e eu fomos de mãos limpas ao show, lotado como de costume. Entramos por portas diferentes do ginásio para tentar localizar as criaturas da noite. O som alto confundia meus sentidos e perturbava minha mente, eu sempre pude pressentir essas malditas criaturas, mas naquele momento não conseguira e isso me irritava. Em meio ao espetáculo, Ozzy aparentava confusão, trocava as letras confundia as palavras, provavelmente inebriado pelo álcool e excessos que o caracterizavam, uma pena considerando o grande vocalista do Black Sabath que já fora. Eis que observo, em sua forma quiróptera, a criatura voando em direção ao palco. A multidão delira enquanto, em vão, tento gritar para Ozzy alertando-o do perigo que corria. Nenhuma reação. Começo a gesticular com os braços sendo seguido por milhares de devotos de Ozzy, Já em desespero e como último recurso, fecho o punho esquerdo e, mantendo presos com o polegar os dedos médio e anular, liberei o indicador e o mínimo deixando-os em riste,
simulando tanto as orelhas como as presas da criatura que o atacava. 

Qual não foi minha surpresa ao ver que fui seguido por milhares de devotos de Ozzy - gesto que até os dias de hoje é repetido a exaustão em concertos do tipo, por certo tendo perdido seu sentido original - e maior foi minha surpresa quando ele, em meio da multidão, me localizou e olhou em meus olhos com agradecimento compartilhando um momento que me enternece até os dias de hoje, eis que ele movimentando-se rapidamente desvencilha-se do ataque da criatura que cai aos seus pés, e com as duas mãos pega a criatura e a leva à boca tomando-lhe a cabeça pondo fim a sua existência maldita. 

(continua)